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quinta-feira, 21 de julho de 2011

Existe Poesia na ilha?

EXISTE POESIA NA ILHA?
(um manifesto para o Verão)

Na Ilha do prazer, todos tem medo do amor; por isso, o poema da ilha deve falar de amor, não diretamente (quem suportaria?), mas indiretamente; ainda que falemos de pedras e de dunas, o tema do poema será o amor e suas metamorfoses. O poema não é uma ilha.
Na Ilha, todas as musas são decaídas, todas as musas estão dormindo, todas as musas são lindíssimas e vão à praia sozinhas, todas as musas precisam do poema, não do poeta.
Na Ilha da ficção, o poeta sofre metamorfoses. Se Baudelaire vivesse aqui, com sua cara de tristeza faria uso de terapias alternativas, shiatsu, yoga e florais de Bach. Se Drumonnd vivesse aqui, seria um poeta municipal, condecorado. Se Vinícius vivesse aqui, largaria os poemas e ficaria só com as mulheres. Se Fernando Pessoa vivesse aqui, morreria de tédio e criaria o seu mais profundo e verdadeiro heterônimo: Sr. Personne. Se Mallarmé vivesse aqui, faria o único poema em linha reta, o poema da linha do horizonte. Na Ilha da ficção, não há poetas, só poemas.
Na Ilha, o poema deve ser quente. A poesia servida fria, o poema parnasiano e concretista, ou pós-modernista da última moda, o poema frio deve ficar no aeroporto, de onde alça voo mais visível. A arte deve ser quente quando o mundo está morno e confuso. O mundo barroco era um caos: o nosso também é.
Na Ilha das mulheres, o poema é pura forma. Isso quer dizer que o poema é puro conteúdo. O poeta é um artesão de conteúdos. O poeta é um arquiteto de dunas.
Na Ilha virtual, do MSN e do Orkut, das praias irreais e de manequins no banho, o poema só tem a oferecer um sistema de sílabas e de silêncio.
A Ilha existe? Nada mais incerto: uma Ilha é sempre interrogável; vamos citá-la entre aspas, vamos soltá-la no mar; ela ressurgirá no poema. Repovoada. E será a ILHA. A Ilha que criamos, não aquela em que caímos.
Na Ilha, o caos está nas ondas, nas pessoas, nos poemas. Mas não há razão para desespero, ilhéus. Entreabrimos uma porta em meio ao caos, em meio ao ruído, e só essa abertura, essa entrada, essa fresta, já assegura a ordem ressonante do poema, o sentido da onda, a poesia na Ilha.


Texto de Heron Moura, professor de lingüística da UFSC.

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